O ano é 1962 e o local é um laboratório da Universidade de Yale, em Connecticut, nos EUA, foi lá que o psicólogo Stanley Milgram (1933-1984) realizou o estudo polêmico e paradigmático que você vai conhecer por esse texto.
Stanley Milgram
Judeu e de família afetada pelo holocausto, Milgram foi influenciado pelos eventos e efeitos violentos da 2º Grande Guerra Mundial e também pelo processo de julgamento de Aldolf Eichmann – um dos mais altos militares da polícia nazista SS – para idealizar seu experimento. A fim de contextualizar, segue um trecho da fala de Eichmman:
“There is a need to draw a line between the leaders responsible and the people like me forced to serve as mere instruments in the hands of the leaders” e “I was not a responsible leader, and as such do not feel myself guilty”, respectivamente, em tradução livre: “É necessário traçar uma linha entre os líderes responsáveis e as pessoas, como eu, forçadas a servir como meros instrumentos nas mãos dos líderes” e “Eu não era um líder responsável e, como tal, não me sinto culpado”.
Adolf Eichmann, durante o processo de seu julgamento, em 1961
Milgram quis investigar quais circunstâncias levavam os homens a cometer barbáries e observar até onde eles seriam capazes de chegar se houvesse um superior responsável por seus atos ou se este lhes passasse instruções para violar a integridade e inferir dor ao outro. E assim, construiu seu experimento para responder à pergunta: “pode ser que Eichmann e milhões de seus cúmplices estavam apenas seguindo ordens? Será que devemos chamá-los todos de cúmplices?”
O Experimento de Milgram
O estudo foi divulgado como se fossem os processos da memória que estivem sendo investigados e, no laboratório, o argumento implicava sobre a relações entre aprendizagem e punição, visando a correção de um comportamento considerado incorreto e, assim, Milgram trouxe um total de 40 homens cobaias ao seu laboratório e estes faziam o papel de um professor que aplicava choques no aluno, sempre que ele errava a resposta, ahh, esses homens também ganhavam 4 dólares e 50 para contribuírem com o estudo.
A primeira fase do experimento compreende 3 pessoas:
- Um laboratorista (da equipe do Milgram)
- Um professor (desempenhado pela cobaia)
- Um aluno (desempenhado por um ator da equipe, mas visto como cobaia pela real cobaia)
Professor e aluno se conheciam antes do teste e então iam para salas separadas onde não podiam ver um ao outro. O professor fazia uma série de associações de palavras e o aluno deveria responder corretamente. A cada resposta errada o aluno “tomava um choque” (o que não acontecia de verdade, mas a nível de efeito) e esses choques aumentavam gradativamente – começando em 15V e indo até 450V.
A imagem ao lado mostra o esquema logístico utilizado para o estudo, onde:
- E é o especialista (laboratorista)
- C é a cobaia, que faz o papel de professor
- A é o ator, da equipe de cientistas, que faz o papel de aluno
Conforme o teste ia decorrendo, os choques iam ficando mais intensos e o aluno (ator) que os recebia manifestava reações de incômodo e dor, até a ausência total de respostas (simulação de desmaio). Caso o professor (cobaia) relutasse em continuar o experimento, o laboratorista (especialista) dava os seguintes comandos:
- Estímulo 1: Por favor, continue.
- Estímulo 2: O experimento requer que você continue.
- Estímulo 3: É absolutamente essencial que você continue.
- Estímulo 4: Você não tem outra escolha a não ser continuar.
Antes de revelar os resultados desse experimento, faço questão de perguntar à você leitor se seria capaz de aplicar choques em uma pessoa que parece estar sentindo dor e pedindo para você parar. O que você faria se um experimento desses dependesse de você? Você causaria dor a um estranho? Se fosse você o professor, respaldado por uma equipe de cientistas apoiados em uma metodologia e que, de certo, sabem o que estão fazendo…você interromperia o estudo? Ou continuaria seguindo a função que lhe foi definida por outro? Faria com maestria e não titubearia pois seu fazer é fundamental para o sucesso do experimento? Ou faria, mas faria com culpa, vergonha e empatia? O que você faria se o seu superior lhe pedisse para fazer algo que machucasse alguém?
Resultados
Segundo o próprio Milgram: “pessoas comuns, simplesmente fazendo seu trabalho, e sem qualquer animosidade pessoal, podem tornar-se agentes de processos terrivelmente destrutivos. Além disso, mesmo quando os efeitos nocivos de seu trabalho se tornam claros e eles são orientados a continuar ações incompatíveis com seus padrões fundamentais de moralidade, relativamente poucas pessoas têm os recursos necessários para resistir à autoridade”.
Resumidamente, todos os participantes chegaram ao choque de 300V e cerca de 2/3 (65%) deram o choque final de 450V. O estudo sugere que a maioria das pessoas vai seguir as instruções de uma figura de autoridade, desde que considere esta uma autoridade legítima. O experimento foi replicado em outros países e obteve resultados semelhantes. Hoje, é impossível, do ponto de vista ético de pesquisas com seres humanos, replicá-lo.
No Cinema
Em 2015, foi lançado o longa-metragem O Experimento de Milgram (Experimenter), dirigido por Michael Almereyda e estrelando Peter Sarsgaard e Winona Ryder. O Filme aborda e ilustra bem os processos envolvidos no experimento, revelando também as reflexões e indagações do Dr. Milgram.
(Netflix, acesso em Fevereiro de 2018)
Referências
Blass, T. (1999). The Milgram paradigm after 35 years: some things we know about obedience to authority. Journal of Applied Social Psychology, 29, (5), 955-978.
Milgram, S. (1963). Behavioral study of obedience. Journal of Abnormal and Social Psychology, 67, 371–378.
Por Caio Ferreira
8 comentários
Denise · 18 de abril de 2023 às 00:32
Não sei há quanto tempo esse artigo não é atualizado, mas o filme não está no catálogo da Netflix.
Fábio Norberto de Souza · 17 de maio de 2023 às 18:27
Pelo meu sentimentalismo e sabendo que Deus permite que as coisas aconteçam não me vejo em nenhum momento preparado para assistir experimentos dessa natureza. Como desde criança vejo que vidas são da pura direção de Deus, não tenho coragem nem de matar para comer. Como aprendemos na Bíblia, “mata e come”. Ao meu ver são experimentos altamente prejudiciais a formação de pessoas em todas as idades.
Geraldo Ventura da Silva · 30 de maio de 2023 às 20:56
Bem, como foi feito creio ser simulação para instruir sobre as possibilidades do grau de maldade no ser humano e que, infelizmente, ocorreu na dura realidade do Nazismo hitlerista e na brutalidade de seus “subordinados”, provando que é, sim a vulnerabilidade das vítimas o mais triste fato do holocausto. A experimento, no filme visou alertar o mundo para o de que é possível praticar o humano, contra o próximo. Prefiro experimentar casos de solidariedade humana, em fazer o bem ao próximo. Terrível a frieza, ou até a fraqueza em não parar antes do pior. Não gosto nem de ver algo assim, ainda que a título educacional. Mas, creio nas possibilidades de crescimento do bem, com a maturidade, gradativamente. Educação, entanto, tem poder de promover, tanto o bem quanto o mal. Eis os seus perigos…
Geraldo Ventura da Silva · 30 de maio de 2023 às 21:09
Tomara que um dia a maldade humana seja menos divulgada nas redes de comunicação e se diminuam as postagens múltiplas do “pior” e aumentem aí a porcentagem da divulgação do bem, nas mídias. Quanto ao lado humano, enquanto natureza há duas certezas nada desprezíveis: a natureza humana comporta, potencialmente, tanto a inclinação para o bem, quanto para o mal. Também é verdade que a natureza religiosa em todos os seres humanos, (sem nenhuma exceção) que representa o potencial para receber a revelação divina do caminho da salvação (pelo arrependimento e fé em Jesus Cristo), embora possa rejeitar também o convite divino, “vinde às bodas”, como Jesus instruiu.
Geraldo Ventura da Silva · 30 de maio de 2023 às 21:21
Meu comentário: Pesquisar faz parte do processo educativo. Nada contra. Ocorre que um professor ao lidar com mentes das mais variadas potencialidades deve sempre levar em conta que lida com mentes em diversas etapas de desenvolvimento. Logo, é preciso agir sempre com sensatez. Seu papel não é apenas produzir ‘conhecimento’, mas, também produzir frutos de sensatez e estímulos ao desenvolvimento do humano nos humanos. G. Ventura da Silva.
Leonor Oliveira · 30 de junho de 2023 às 11:14
Confesso que fiquei chocada com esse relato. Eu nunca soube de nada disso! Realmente, o ser humano pode ser mostruoso se não tiver uma educação que lhe desenovolva a consciência para o bem e para o amor.
Angela Maria Santos de Oliveira · 22 de abril de 2024 às 08:06
Realmente é de ficar chocada com esse tipo de relato, pesquisar faz parte do processo de aprendizado educativo, mas isso não quer dizer que deva se exaltar o pior lado do ser humano, em tudo deve se ter um limite, e preciso fazer coisas para despertar o melhor em todos, e uma das coisas a se despertar é a inpatia, sonoridade e por fim o amor, infelizmente o mundo está cheio de ser humano desprezíveis e levando em consideração que a capacidade humana é infinita tanto para o bem quanto para o mal, se espera que se possamos desenvolver maneiras de colocar no mundo pessoas melhores, o mundo precisa disso, que o melhor possa começar por nós mesmo, a hora é agora.
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