Acredito que algumas reflexões precisam sempre serem feitas sobre se tornar um terapeuta, alguns diriam que tudo começa com o curso de psicologia, você faz o vestibular, passa, estuda por cinco anos, faz os estágios no meio disso, experimenta a clínica e aí pronto, lá está o terapeuta formado. Bom, posso falar da minha experiência frente a isso, como vejo a minha constituição enquanto psicólogo e enquanto terapeuta, há um tempo atrás eu acreditaria que é isso mesmo, cinco anos de psicologia e lá está você terapeuta pronto, mas hoje vejo com outros olhos, com alguns anos de prática, estudos e várias vivências nessa área, compreendo que tudo vai um pouco além disso.

No meu caso percebo que sempre fui curioso em ouvir as pessoas, eu sempre quis saber as histórias, as inspirações, o que existia por trás dos sorrisos e lágrimas, não à toa que sempre gostei de cinema, sempre gostei de ver e entender as narrativas, me surpreender com elas e aprender com elas, ali já existiam os germes de um terapeuta. Na faculdade aprendendo as teorias que compreendiam, explicavam e questionavam o ser humano, descobri qual era o meu caminho nessa ciência e nessa profissão, a clínica me contagiava e me convidava a ouvir novas histórias, mas agora não fictícias, e ainda por cima de alguma forma ajudar no desfecho delas, segui neste caminho.

Eu poderia simplesmente te dizer que a clínica exige uma aplicação muito grande e muitas horas de estudos, tudo isso é verdade, mas este espaço também exige que você sinta, que você se aplique em ser mais humano, e ainda mais, que torne-se um humano profundamente empático, que busque sentir a pessoa na sua frente com o máximo de sensibilidade. Muito falamos hoje sobre empatia, sobre “colocar-se no lugar do outro”, mas vai além, é buscar sentir o outro, a dor, a alegria, o medo, a angústia, o amor, a paixão e tantos outros sentimentos e emoções que vão emergir ali, é ver o mundo com os olhos do outro ou pelo menos chegar o mais perto disso possível, como pontuou sabiamente Carl Jung em sua famosa máxima “ao tocar uma alma humana, seja apenas outra alma humana”. Ser um terapeuta existencial é despojar-se de orgulho, é despir-se das armaduras teóricas, e abrir-se junto com a pessoa a sua frente.

O outro Carl, o Rogers disse também sobre ser empático em muitas partes de sua obra, e aqui destaco:

“Significa viver temporariamente a vida do outro, morar ali dentro, e se mover ali de forma muito delicada, sem fazer nenhum tipo de julgamento, buscando perceber sentimentos que ela provavelmente não tomou consciência, bem como procurando não reprimir os sentimentos que pareçam ameaçadores e que ela porventura já tenha percebido…”

Ele está falando sobre esse tocar a alma, e isso compreendo que só pode emergir num profissional, quando ele vivenciar a clínica humildemente, não como o que ensinará a vida ou as soluções, mas com o espírito de explorador da alma, com os olhos de pesquisador das emoções e o coração de um aprendiz, que arrisca, erra, aprende, melhora e assim forja-se aos poucos.

Um importante nome da fenomenologia no Brasil, Yolanda Forghieri, em uma entrevista sobre sua vida revela como vê a clínica não como um espaço de neutralidade e distanciamento, mas um lugar de abertura, acolhimento, compreensão e profunda empatia, como o espaço para ser mais humano do que nunca.

Vejo que assim funciona a construção, a forja de um terapeuta, no calor da vivência, resfriado pela exatidão da teoria e novamente exposto ao calor da escuta e prática terapêutica, e aos poucos irá se moldando, hoje melhor e mais afiado que ontem.

O trecho acima foi extraído e livremente traduzido de uma aula proferida por Carl Rogers em 1974.

Atenciosamente,

Patricio Lauro

Psicólogo – CRP 18/03237


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