Neurose Obsessiva

Pensando uma estrutura no século XXI

Pensamentos ruminantes e ações que devem ser repetidas fielmente, fazem parte da caricatura do neurótico obsessivo. Hoje, um termo que parece ser usado de forma leviana na maioria das vezes está em todos os lugares: “Fulano tem TOC”.

Uma estrutura clínica que foi delimitada por Freud, ao lado da histeria, as duas sendo as grandes apresentações do sintoma neurótico.

Tentarei explanar a noção de estrutura clínica em Psicanálise, focando em discussões acerca da relevância do diagnóstico no início do tratamento.

O tema da Neurose Obsessiva foi o tema do meu TCC, intitulado: “O Manejo da Transferência na Neurose Obsessiva: De Freud à Lacan” (O texto foi publicado no primeiro volume da revista científica da Sociedade dos Psicólogos. Você pode encontra-lo clicando aqui). Nele, discorri sobre a noção de estrutura obsessiva no entendimento de Freud e de Lacan, fazendo aportes com o caso “O Homem dos Ratos”, publicado em 1909.

A estrutura obsessiva em Freud e Lacan

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(Imagem retirada da Internet)

A neurose obsessiva foi para Freud objeto de pesquisa por algum tempo. Dois de seus grandes casos relatados (O Homem dos Ratos e O Homem dos Lobos), apresentavam essa estrutura.

Mas o que é uma estrutura? É, essencialmente, uma forma de se colocar frente ao outro, uma forma de estar no mundo. A estrutura clínica é relevante para a clínica à partir do diagnóstico estabelecido pelo analista, no decorrer das entrevistas preliminares (Quinet, 2005).Ela é relevante na medida em que a direção de tratamento será pensada a partir da estrutura de cada paciente.

A estrutura diz respeito à como o sujeito lida com o seu desejo. Em que lugar se coloca. Não importa o objeto em si, mas a relação que é estabelecida com ele. A investigação do sintoma do sujeito é realizada pelo analista, portanto, através da transferência, via do tratamento.

Falaremos agora da estrutura obsessiva em si.

O sujeito obsessivo se coloca de forma passiva em relação ao gozo, e seu comportamento é caracterizado por inibições e uma busca por não-gozar.

A ambivalência em relação ao objeto de desejo inicial causa uma dúvida eterna, uma luta entre amor e ódio estaria justamente no âmago do mecanismo obsessiva (Freud, 1909/2013). Por isso, o sujeito vacila.

Na construção do caso clínico “O Homem dos Ratos”*, Freud apresenta seus argumentos acerca da neurose obsessiva, e a apresentação de seus sintomas.

Lacan, ao relacionar seu pensamento com Hegel, dizia que o sujeito obsessivo se coloca sempre em posição de escravo, onde o Outro estaria sempre no lugar de senhor. O obsessivo espera (na fantasia) então, que o senhor morra, para que possa gozar. Quando o chefe morrer, quando sair da casa dos pais, quando, quando…

Nessa perspectiva, o obsessivo encontra dificuldades na “passagem ao ato”, em gozar de fato, sofrendo de inibições constantes.

Lacan pensa também os efeitos da linguagem no sujeito. No caso do obsessivo, o psicanalista afirma estarmos diante de um sujeito, em geral, passivo frente ao seu desejo, e que foi investido pelo dizer materno de tal maneira que ficou na posição de falo do Outro. Isto é, em termos do Complexo de Édipo, o sujeito não passou à posição em que busca o falo no Outro.

Quanto à ritualização do obsessivo, podemos pensar nas regras (na maioria das vezes absurdas) impostas pelo próprio sujeito à si mesmo. Como no “Homem dos Ratos”, quando o paciente achava que seu pai iria morrer, caso se relacionasse com uma mulher.

Um texto que podemos relacionar neste momento é “O Fantasma da Ópera”.

O conto de Gaston Leroux (1868 – 1927) se mostrou, para mim, fonte de questionamento acerca do mecanismo obsessivo. Na estória, os novos administradores de um teatro em Paris, herdam uma relação com um ser misterioso. Sofrem com a presença de um “fantasma”. Alguém que se mostra perigoso, caso não seja lhe seja pago uma quantia periodicamente.

Paga-se o fantasma sem saber o que ele é, de fato.

Uma estrutura para o século XXI

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(Imagem retirada da Internet)

Há uma cena no seriado de televisão “Friends” que ilustra o conflito obsessivo para com o Outro. Ele acontece em um episódio em quê ocorre um blecaute em parte da cidade de Nova York. Com isso, pessoas ficam presas em diferentes locais. Um deles é o banco. O personagem Chandler, que estava realizando uma transação qualquer, acaba ficando “encalhado” na agência com uma estrela da televisão. Uma moça muito bonita, desejada por todos os homens (ou pelo menos assim pensa Chandler).

Durante todo o tempo, Chandler se debate com a vontade de falar com a garota, mas não consegue.

O obsessivo em análise é, no mínimo, cômico. Se debate para não falar de seus desejos, dá voltas e voltas, muitas vezes falando de temas absolutamente triviais, e o desafio do analista é justamente provocar a “histerização” do discurso (Quinet, 2005). O sujeito fala para imobilizar o analista, tem que ter tudo já pensado, levando, às vezes, os assuntos pré-selecionados para a análise, o que é interrogado pelo princípio básico da análise: a associação livre.

Alguns autores argumentam que hoje em dia parece haver uma “obsessivação” do feminino. A mulher, que era mais relacionada por Freud à uma estrutura histérica, parece gradativamente estar passando à um discurso obsessivo. As coisas parecem não tem mais limite, mais falta.

Com a queda do significante fálico, não parece mais haver limites para as coisas. O que é de uma certa maneira o discurso obsessivo. Não ter falta para não ter desejo.

Como já disse sabiamente um psicanalista: “O obsessivo é aquele que fica feliz com o 0x0 fora de casa”.

Que partamos mais para o ataque.

Por Igor Banin

*Um dos pilares para o entendimento clínico da neurose obsessiva, em Freud.

 

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Referências Bibliográficas

Chemama, R. (1999). A neurose obsessiva feminina hoje. In Revista da Associação Psicanalítica de Porto Alegre. (pp. 16-25, Associação Psicanalítica de Porto Alegre, nº17). Porto Alegre.

Dor, J. (1991). Os traços da estrutura obsessiva. In Estruturas e Clínica Psicanalítica. (pp. 100-104). Rio de Janeiro: Livrarias Taurus-Timbre Editores.

Freud, S. (1909/2013). O Homem dos Ratos In Observações sobre um caso de Neurose Obsessiva. (pp. 13-112, Obras completas de Sigmund Freud, v.9). São Paulo: Companhia das Letras.

Lacôte, C. (1999) A oralidade da Neurose Obsessiva. In Revista da Associação Psicanalítica de Porto Alegre. (pp. 42-51, Associação Psicanalítica de Porto Alegre).  Porto Alegre.

Leroux, G. (2015). O fantasma da Ópera. São Paulo: L&PM.

Mees, L. (1999). A neurose obsessiva. In Revista da Associação Psicanalítica de Porto Alegre. (pp. 37-41, Associação Psicanalítica de Porto Alegre, nº17). Porto Alegre.

Quinet, A. (2005) A função das entrevistas preliminares. In As 4+1 condições da análise. (pp. 13 – 34). Rio de Janeiro: Jorge Zahar.

 

3 comentários em “Neurose Obsessiva”

  1. Eu percebo é que seja, de certa forma, inerente: a obsessão com trauma psicológico. Uma parapsicologa, num curso de extensão, usou a expressão: “mente tagarela”! Me lembro que no penúltimo setor que trabalhei e por estar minha mesa na sala de entrada do setor (semelhante a recepção), muitas pessoas conversavam ali, mas bem próximo a minha mesa, quando não era bem próximo ao meu ouvido e alto! Sala sem ventilação e nem ar condicionado! Me lembro bem o momento da sensação que tive de “rompimento”, como um disjuntor que se desliga “por si” e ai a visão que se tem da própria história é como se lembrasse da história de vida de outra pessoa! O contexto parece de eterno pos traumático: do nada vem lembranças até de superações havidas, mas como se estivesse passando pela provação. Ai é seguir o lema do AA: “Viver um dia de cada vez”!

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