O lugar vazio do analista

O que é o lugar do analista?

Às vezes eu tenho medo do que você pode pensar de mim, falo tantas coisas loucas”. Creio que todos os colegas clínicos já tenham, vez ou outra, escutado essa frase de um paciente, em tantas formas. Toda vez que nos encontramos nessa situação, buscamos nos esquivar dessa demanda do paciente.O que o paciente quer ao dizer isso? Quer (fazer) acreditar que você está lá com ele, junto à ele. Busca sua aprovação (ou desaprovação), talvez. De uma forma ou de outra, a posição do analista é complicada, ele está e não está na sessão. Veremos à frente.

Em contrapartida à outras linhas teóricas, a psicanálise lacaniana busca implicar o sujeito em sua própria construção narrativa, isto é, quem é ele, na gramática de sofrimento que nos conta. De que lugar fala, para quem fala, em nome de quê fala. Observamos a relação que o analisando estabelece com a própria fala. São questões que perpassam pelo que Freud chamou de transferência.

A transferência, enquanto fenômeno, é inerente à todas as relações humanas, sendo assim, não aparece só na clínica. O que acontece nesse espaço, é que usamo-la para fazer o paciente mudar de posição discursiva, ou seja, em benefício do tratamento. Para tanto, temos que ter bem claras, nossa posição e função, enquanto analistas, no trabalho de cada paciente.

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(Imagem retirada da Internet)

O lugar do analista é um lugar de vazio. Ponto. Foi assim que uma supervisora definiu nosso trabalho na clínica, quando eu ainda estava na faculdade. Essa concepção não é comum à todas as escolas da Psicanálise. Em algumas delas, como em Bion e Winnicott, acredita-se que o terapeuta deve “digerir” as palavras do paciente e devolvê-las para ele. Alguns analistas inclusive, “emprestam” um pouco para o paciente, ou seja, servem como um ponto de ancoragem, ou um porto seguro para esse. Nós (lacanianos) pensamos a direção de tratamento de forma distinta. Devemos justamente instigar o paciente, tirá-lo de seu “lugar cômodo”, ou, usando a expressão usada hoje em dia, tirá-lo de sua “zona de conforto”, onde ele sintomatiza, sofrendo.

Na psicanálise de orientação lacaniana, quando em sessão, o analista deve suspender seus próprios conteúdos, seus preconceitos, suas concepções do mundo, seus achismos, daí o lugar vazio, em suma você não está lá. O lugar vazio à quem se dirige o analisando, permite uma circulação do discurso do mesmo, o que não ocorre fora da análise, até porque as outras pessoas não suspendem seus conteúdos.

O psicanalista Juan David Nasio é bem didático ao falar sobre o tema: “… ocupar o lugar do semblante do domínio, isto é, o lugar do semblante da direção, o semblante de ser o mestre, sem esquecer que se trata apenas de um semblante”. Dirigimos o tratamento, no entanto, o resultado que almejamos não provém dessa direção.

Um lacaniano fala muito menos em sessão, o mínimo possível. O paciente com esse espaço, consegue mudar de posição, ou nos termos técnicos, consegue fazer uma torção discursiva. Assunto para outro texto aqui no blog.

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(Imagem retirada da Internet)

Assumir aposição de analista não é nada fácil. Muitas vezes cometemos deslizes. Por isso a análise pessoal se mostra imprescindível. Até a próxima.

Bibliografia:

Como trabalha um psicanalista? J. D. Nasio, 1999, Editora Zahar.

“A psicanálise do século XXI: Lacan para desesperados da crise. Palestra da série: Invenção do Contemporâneo por Jorge Forbes, feita em 2010. Promovido pela CPFL Cultura. Link: https://www.youtube.com/watch?v=KWkEMR7CbS4

Por Igor Banin

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